Os Games como Arte
07/03/2012 by: thiagoOs Games como Arte – Gabriela Freitas
O post sobre Videogames e Cultura, escrito por Sabrina Carmona para o blog do CS:Games há algumas semanas, me lembrou de outra discussão sobre games que há muito ouço e que, com certeza, ainda ouvirei muito: qual é a relação entre games e arte?
Ao meu ver, é possível analisar essa relação de três modos diferentes: os games como arte, a arte nos games e o uso dos elementos dos games na arte. Neste poste, falaremos do primeiro tipo de relação, ou seja, os games podem ser considerados uma forma de expressão artística.
Esse tema foi muito abordado há uns dois anos, quando Roger Ebert, crítico do Chicago Sun-Times, escreveu um artigo intitulado “Video games can never be art” (Videogame nunca será arte). Até hoje esse artigo, ainda publicado no site do jornal, recebe comentários de gamers, artistas, críticos, entre outros. A partir daí, vários textos foram escritos, defendendo diversas posições: como os games podem se tornar arte; como já são arte; como não são arte, mas que nos levam a arte, entre outras. Um desses textos foi escrito para a Revista Galileu, intitulada “Videogames podem ser arte?”, o qual reúne várias opiniões de designer de games, críticos, jornalistas e historiadores – todos gamers – sobre o assunto em questão.
O artigo de Ebert começa explicando que arte é um conceito vago, que mudou muito durante a história e que, até hoje, varia de pessoa para pessoa. Isso é apenas lógico: como a arte é uma manifestação da cultura, sua definição muda conforme a cultura muda. No renascentismo, só era arte aquilo que copiava o real. No surrealismo, arte era aquilo feito pelo inconsciente. De um momento para outro, a arte deixa de ser algo que só serve para ser apreciado para se tornar uma forma de protesto. No entanto, estamos analisando a relação da arte com os games – produtos recente, que datam desse século, e não da época do renascentismo, nem na do surrealismo. Por isso, usaremos apenas conceitos atuais para definir tanto a arte quanto os games.
A definição de arte encontrada nos dicionários de hoje pode ser resumida em: “a arte é uma criação humana que visa sintetizar a história, os sentimentos e a cultura humana, usando como base valores estéticos como beleza, equilíbrio, desequilíbrio, revolta. A arte pode trabalhar apenas com a visão ou com qualquer outro sentido, assim como pode, também, misturá-los. Ela se apresenta sob diversas formas”.
Os games, assim como a arte, sintetizam períodos da história humana, como o Call of Duty, franquia de jogos geralmente ambientada na 2ª guerra mundial. Esse jogo pode fazer com que o usuário experimente emoções ao ser confrontado com tal cenário. Esse era o exatamente o objetivo que muitos pintores plásticos dessa época tiveram ao produzir suas obras.
Assim como a capacidade de sintetizar a história humana, a arte e os games, podem sintetizar os sentimentos humanos. Isso ocorre, principalmente, quando o protagonista é o que chamamos de “herói trágico”, ou seja, alguém atormentado por suas escolhas, pelo seu destino, em dúvida do que é certo e do que é errado. Isso porque esse tipo de personagem nos faz refletir, assim como ele. É possível questionarmos nossa moral ao vivermos na pele de um snipper, é possível ficar triste com o sacrifício de um personagem que nos acompanha durante a nossa jornada para que alcancemos o objetivo final.
Em outras palavras, os games provocam reações nos usuários, assim como a arte o faz nos observadores. Quando jogamos, ficamos tão imersos no ambiente que nos é apresentado, que é como se vivenciassemos aquela situação. Podemos nos sentir atormentados, ansiosos, com medo, animados, realizados, frustrados, tristes.
Essa imersão descrita acima é conseguida por uma série de fatores: um bom roteiro, personagens carismáticos, uma ambientação de acordo com a narrativa e uma boa paisagem sonora. Essa ambientação e esse soundtrack fazem uso de valores estéticos para seduzir o usuário e para poder despertar sentimentos e relator a história humana.
Muitos, incluindo Ebert, argumentam que não é possível concluir que os games são uma forma de expressão cultural, pela pouca quantidade de tempo que estamos produzindo-os. Essa declaração, por sua vez, gera muitas controvérsias, pois já é possível ver vários indícios de que os games não só já assumiram esse status, como também pretendem mantê-lo. Por ter sido abordado no post da Sabrina Carmona, citado acima, não irei descrever a última relação, entre games e cultura.
Tendo abordado todos os tópicos encaixem o game na definição de arte, só falta um aspecto a ser abordado: a intenção. Ebert diz em seu artigo que, a maior intenção dos jogos é produzir um ambiente de entretenimento interativo. No entanto, não vejo porque a intenção do artista influencia no resultado obtido. Várias obras precisam da interação para serem experimentadas de maneira efetiva, como os Rotoreliefs do Duchamp, que dependem da forma como nos posicionamos e como olhamos para eles para podemos apreciá-los.
Um passo para a comprovação de que games são arte foi feito pelos Estados Unidos em 2011. Os games foram classificados como arte por lei. Infelizmente, essa é uma realidade um pouco longe para o Brasil, que ainda tenta censurar os games e dificultar sua entrada no país.
Gabriela Teles Freitas - Graduanda em Tecnologia e Mídias Digitais na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), monitora em Sistema de Hipermídias: Fundamentos na mesma instituição. Desenvolve projeto de pesquisa no nível de iniciação científica junto ao CNPq com o tema “Always Restless – uma abordagem das angústias juvenis em forma de jogo digital”, tendo como orientador o Prof. Dr. Fábio Fernandes. O projeto tem como tema a abordagem de angústias tipicamente associadas aos adolescentes em um ambiente virtual de entretenimento. Participante do grupo de pesquisa CS:Games do Programa de Pós-Graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital (TIDD) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Responsável pelo blog de Tecnologia e Mídias Digitais da PUC-SP. Atua em pesquisa de assuntos relacionado à games, cinema e adaptação de roteiros e narrativas. Co-responsável pelo blog e pelas redes sociais do grupo.