Jetpack Joyride… Ok, isso funciona!

17/09/2012 by: thiago

Jetpack Joyride… Ok, isso funciona! – Gabriela Freitas

Os leitores que estudaram Game Design em algum ponto de suas vidas devem estar familiarizados com a frase frequentemente dita: “não há fórmula para deixar um jogo perfeito”. E de fato, não há. No entanto, se houvesse, poderia dizer com segurança que Jetpack Joyride – da Halfbrick – acertou em cheio… No que se diz respeito aos jogos casuais, pelo menos. E é então que devemos parar para refletir: porque essa distinção – entre um serious game e um casual game - é tão importante?

Um jogo, assim como qualquer outra mídia de entretenimento, deve se adequar ao suporte em que se insere. Para explicar melhor isso, tomaremos um exemplo mais banal e perceptível. Um episódio de uma webserie deve ter uma duração menor do que um episódio de um série de TV. Porquê? Bem: a televisão é posta na frente de um sofá, o espectador pode se sentar nele, ajeitar as luzes conforme mais lhe agrada, talvez até se deitar com um endredom e um lanche; por outro lado, na frente de um computador, de um tablet ou de um celular – os quais possuem telas cada vez menores – ficamos sentados em uma cadeira, no metrô, ônibus, tendo que segurar o aparelho (quando esse é portátil) de forma que mais nos agrada, inclinar a cabeça, sem qualquer controle sobre a iluminação do ambiente e, normalmente, enquanto estamos esperando outra coisa acontecer. É, portanto, claramente percepitível que assistir episódios na televisão é muito mais convidativo do que vê-los no celular. Por isso, vídeos para serem vistos nessa última mídia devem ter sua duração menor e, portanto, devem ser escritos valorizando outros pontos do roteiro, para que possam se conectar com o público de maneira eficiente para que esse possa continuar a assistir ao episódio e voltar posteriormente para outros.

Assim como o vídeo, o jogo deve mudar o foco ao estar inserido em um suporte móvel, sem mudar, no entanto, as características que definem ele como um jogo. Em outras palavras, o jogo deve permanecer com as características que fazem com que ele seja classificado como tal – as regras, os objetivos, os procedimentos, limites, entre outros elementos – mas ele também deve se adequar de forma que possa se conectar com as emoções dos jogadores de maneira que ele sinta a necessidade de voltar, posteriormente, a jogá-lo. O mercado de casual games está em crescente expansão, sim, mas ele ainda é novo – até porque toda a indústria de videogames é nova, principalmente ao compará-la com as outras indústrias de entretenimento. Por isso ainda é muito comum “tropeçar” com uma grande quantidade de jogos casuais para mobile que tendam mais para um dos lados e acabam não conseguindo dar ao usuário nenhuma experiência de maneira agradável e concreta.

O jogo Jetpack Joyride (disponível na Apple Store para iPhone e iPad e, mais recentemente, como aplicativo do Facebook) no entanto consegue equilibrar esses atributos de uma maneira maravilhosa. Não ficarei aqui falando o que faz dele um jogo de joyride ‘em up (também conhecido como endless survival game) atraente por si só, porque isso denotaria muita defesa e ainda assim se apoiaria em questões muito subjetivas. Defenderei, no entanto, o que faz dele um jogo atraente para o mobile.

Segundo a MoMinis – empresa especializada em desenvolvimento e publicação de jogos mobile para Android – um jogo casual, para que possa se conectar com o jogador e fazer com que ele retorne ao aplicativo, deve ser:

a. simples;

b. divertido;

c. desafiador e

d. viciante

Em questões de gameplay, Jetpack Joyride é simples. Você deve, basicamente, fazer com que o personagem, que está sempre correndo, não morra e, para isso, basta um dedo. Com um toque em qualquer posição da tela e aplicando a pressão correta, já é possível ter uma experiência com o jogo. Mesmo sendo tão simples, ele é divertido, e isso deve ser atribuito, em grande parte, a ótima arte e level design do jogo: as animações são simples, engraçadas e bonitas e fazem com que você nem se decepcione tanto em ter seu personagem eletrocutado, pois elas fazem você rir da situação. É um jogo desafiador: ele fica cada vez mais rápido; os obstáculos ficam cada vez mais complicados – por exemplo, os lasers começam a se mover na tela, de cima para baixo, quando antes ficavam apenas imóveis – e, conforme você consegue subir de level, as missões ficam cada vez mais complicadas, mas não necessariamente mais demoradas – o que é importante para um jogo casual, por motivos já explicados.

Por fim, é um jogo viciante, independente se você escolhe apenas jogar para bater seu recorde de distância e de moedas coletadas, ou se decide tentar completar todas as missões até chegar ao fim, ganhar um distintivo único e recomeçar, buscando completar novamente as missões para ter outro distintivo em sua coleção, ou se prefere tentar completar os achivements (os quais nem todos tem sua descrição disponível, deixando muitos para serem destravados ao acaso), que funcionam como missões finitas muito mais desafiadoras e irônicas, ou se prefere tentar aproveitar tudo o que a loja tem a oferecer, comprando diferentes roupas, jatos e veículos com as moedas coletadas durante o jogo, ou se você decide aproveitar o jogo em todo o seu potencial, de todas as formas citadas anteriormente.

Segundo a mesma pesquisa realizada pela empresa, os jogos casuais são melhores aproveitados quando possuem:

a. tutoriais dinâmicos;

b. um começo rápido e

c. a possibilidade de aprender com a experiência.

O jogo em questão não precisa de tutorial, pois aprendê-lo é muito intuitivo, mais uma vez devido a arte do jogo: os avisos visuais e sonoros e os feedbacks são fáceis de entender e de aprender com eles. Por exemplo, aparece um ponto de exclamação na tela e você é atingido por um míssil por não ter se movido… dificilmente você ficará parado da próxima vez que ver esse aviso na tela. Ao clicar no ícone do aplicativo, é mais fácil ir direto ao jogo do que ir ao main menu – e, devo confessar, que diversas vezes já fiquei presa no jogo devido a isso.

Outro fato que estimula o jogador a voltar é o feedback dado pelo jogo. Dependendo da missão, a interação entre o personagem e um certo objeto do jogo muda, fazendo com que o usuário saiba quando ele está realizando seus objetivos de maneira eficaz. Além disso, devido a um aviso na tela, o usuário sabe assim que as missões são completadas e quantas estrelas ele ganha com cada uma. Após a “partida”, caso a missão não tenha sido completada, por exemplo, por só ter desviado de metade dos mísseis necessários, a quantidade restante fica armezenada para que o usuário siba qual é a “nova missão”; caso tenha sido completada, a quantidade as estrelas ganhas com tal missão são contabilizadas, fazendo com que ele saiba exatamente quantas faltam para que ele suba ne level. Os cinco primeiros léveis marcam estrelas bronzeadas, os cinco seguintes, prateadas e os cinco últimos, douradas, assim o jogador sabe exatamente quantos léveis faltam para que ele ganhe um distintivo único (dentre a quantidade praticamente infinita disponibilizada), o qual fica mantido em seu profile, o qual ele pode comparar – e competir – com o de seus amigos que também jogam. Também é mantido no profile todos os recordes obtidos, inclusive as maneiras em que o jogador morre. O mesmo acontece com os achivements: quando descritos, eles marcam o que faltam para completá-lo e, uma vez liberados, um troféu único é dado ao usuário. Poder acompanhar esse progresso, ainda segundo a MoMinis, é importante para um jogador.

Para finalizar, retomo ao que já foi dito: o jogo e o jogador devem se conectar emocionalmente. Para que o usuário se ligue com o jogo – e, portanto, volte repetidas vezes após o contato inicial -, esse jogo deve fornecer emoção para esse jogador, por meio de:

a. momentos felizes;

b. momentos engraçados e

c. adrenalina.

Baseando-me em experiências pessoais: o Jetpack Joyride consegue fornecer exatamente essas emoções todas as vezes em que o jogador permite, ou seja, toda vez que ele de fato explora o que o jogo disponibiliza a ele. Fico feliz cada vez que vejo o aviso de uma missão completada, a animação de extras ou veículos sendo coletados, a de estrelas sendo contabilizadas, a de um level sendo superado, e ainda mais quando é um aviso de achivement alcançado ou, finalmente, um distintivo ganho. O jogo disponibiliza uma imagem aleatória de algum momento da “partida” e permite que você a salve em seu aparelho, o que eu o fiz por diversas vezes, pelo simples fato de ter pego justamente um momento engraçado do jogo (normalmente, as mais diversas mortes). Por fim, o jogo não oferece adrenalina apenas por ser um joyride ‘em up, mas porque ele o envolve de tal forma que você não consegue evitar essa sensação de felicidade, agitação e satisfação toda vez que percebe que você pode superar o seu recorde.

Esses são apenas alguns dos motivos, uma vez que não chequei a comentar especificamente sobre game quality, que fazem do jogo Jetpack Joyride um exemplo a ser estudado por game designers que querem compreender melhor e se aventurar no mundo dos jogos casuais.

Gabriela Teles Freitas - Graduanda em Tecnologia e Mídias Digitais na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), monitora em Sistema de Hipermídias: Fundamentos na mesma instituição. Desenvolve projeto de pesquisa no nível de iniciação científica  junto ao CNPq com o tema “Always Restless – uma abordagem das angústias juvenis em forma de jogo digital”, tendo como orientador o Prof. Dr. Fábio Fernandes. O projeto tem como tema a abordagem de angústias tipicamente associadas aos adolescentes em um ambiente virtual de entretenimento. Participante do grupo de pesquisa CS:Games do Programa de Pós-Graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital (TIDD) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Responsável pelo blog de Tecnologia e Mídias Digitais da PUC-SP. Atua em pesquisa de assuntos relacionado à games, cinema e adaptação de roteiros e narrativas. Co-responsável pelo blog e pelas redes sociais do grupo.

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