Cultura digital, sociedade e política

26/06/2014

Food for Thought

 

Faz parte da nossa história retratar comida, desde os primórdios, e mais tarde na transição da Idade Média para a Idade Moderna, o gênero artístico natureza morta fez grande sucesso nos séculos XVI e XVII[1], o pintor Giuseppe Arcimboldo[2] inovou nessa técnica retratando, entre vários, seus mecenas utilizando frutas, legumes, verduras e peixes.

 

Fonte: http://www.giuseppe-arcimboldo.org

Fonte: http://www.giuseppe-arcimboldo.org

 

Posteriormente com a invenção do rádio e da televisão os programas de culinária garantiram seu lugar nas grades horárias das emissoras. E ainda hoje as receitas, de alguma forma, também fazem parte de programas de entretenimento ou diversidade, sem terem perdido seus programas exclusivos.
Recentemente, na era digital, essa idolatria mantém-se presente nas ferramentas digitais, aplicativos para smartphones e tablets, blogs, fotologs, comunidades e redes sociais. Ao olhar o Facebook é possível verificar a grande quantidade de posts relacionados a comida e confraternizações envolvendo comida, os quais parecem aumentar ainda mais, caso seja feriado, ou se alguns dos amigos estão de férias. A comida tem grande importância para nós, e o fato de poder compartilhar imagens de churrascos, almoços, jantares, sobremesas e sorvetes com os amigos parece potencializar a sensação de prazer já associada à comida. Isso não se limita ao rol de comidas de confraternização, as comidas saudáveis, aquelas pós-malhação, ou as pertencentes à dieta de perda de peso, também têm seu lugar.

De acordo com o Jornal da Manhã, de Minas Gerais, em janeiro de 2014, há 1,19 bilhão de usuários no Facebook, os quais clicam no botão de curtir 4,5 bilhões de vezes todos os dias, e compartilham a cada 24 horas, 4,75bilhões atualizações de status, vídeos e fotos de gatos e de comida.[3]

Ao combinarmos a já antiga pré-disposição ao compartilhamento de comida em momentos de celebrações, à portabilidade e agilidade que a tecnologia trouxe através dos smartphones e tablets, e o espírito do compartilhamento presente na internet, que faz parte de sua gênese, o resultado são as grandes quantidades de atualizações de status diárias, relacionadas a refeições, receitas e comida em geral.
http://www.giuseppe-arcimboldo.org

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As tecnologias digitais também revolucionaram as relações sociais criando uma nova dinâmica. As redes sociais são responsáveis pelo desenvolvimento de novas formas de interação e através dela é possível perceber o tipo de relação que se tem com os outros atores e com o objeto em questão (Recuero, 2009: 33). O compartilhamento de fotos ao lado de potes de Nutella, bolinhos de bacalhau, ou até celebrando a conclusão de uma receita de família preparada de forma caseira nos moldes tradicionais ajudam a revelar o estilo de vida e as mensagens que determinada pessoa busca transmitir. Ao associar-se a uma comunidade, ou integrar-se a um grupo, obtém-se acesso a diferentes conteúdos produzidos também por esses atores, e novas relações têm início através disso.

Ao associar-se a uma comunidade no Orkut, por exemplo, ou ao comentar em um novo weblog ou fotolog, um indivíduo pode estar iniciando interações através das quais vai ter acesso a um tipo diferente de capital social, ou ainda, a redes diferentes. (RECUERO, 2009: p.52)

Nesse novo ambiente as relações sociais se desenvolvem sem necessariamente as pessoas se conhecerem, mas o fato de publicarem suas preferências e atividades as une, criando assim novas comunidades, consequentemente novas discussões e posteriormente novos conteúdos, dando início a um novo ciclo que se repetirá por várias vezes.

As fotos também têm papel importantíssimo nesse cenário, uma vez que são elas as responsáveis por aproximar os interlocutores, através das imagens. Benjamin em seu texto “A Obra de Arte na Era de Sua Reprodutibilidade Técnica” menciona exatamente essa propriedade da fotografia, que é “fazer as coisas ficarem mais próximas” (Benjamin, 1985: 170), mas em detrimento do caráter único das obras de arte.

A questão da exclusividade da obra, ou nesse caso da imagem ou foto, ou ainda a propriedade desta não é um problema, o valor desse material está totalmente relacionado ao seu compartilhamento, à quantidade de curtidas que a foto receberá e à quantidade de re-compartilhamentos que ela tiver. Esse é o ponto de convergência com a filosofia da internet, associada à liberdade de criação e a sua função de ser “o maior repositório de informações que a humanidade já viu” (Amadeu; Santana, 2007).

Ao se compartilhar a foto o objetivo é comunicar o estado de espírito, as relações sociais, o estilo de vida. Os mais variados sentimentos e desejos podem ser retratados através da prato que integra a foto: se a pessoa está em um restaurante chique ou não, se está na intimidade de um jantar com pessoas bonitas e famosas, se está comunicando que cultiva o corpo e a mente saindo da academia e “curtindo” um prato saudável, se precisa fazer inveja aos outros, ou se precisa incitá-los a cometer o pecado da gula e comer aquela sobremesa maravilhosa.

A capacidade de comunicação que a comida tem é imensa. Associado a isso há o fato de que “o compartilhamento em si é uma característica humana, não tecnológica” (Shirky, 2011: 142). A evolução da tecnologia em geral e a internet proporcionaram as ferramentas para tornar esse compartilhamento mais rápido, barato, fácil e interessante.

http://www.giuseppe-arcimboldo.org

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Uma agência de propaganda mapeou o que motiva o compartilhamento de fotos de comida: 25% são fotos cotidianas apenas para mostrar aos outros o que se está comendo; 22% estão documentando pratos que foram preparados por elas mesmas, seja como uma comemoração da conquista, ou buscando aprovação da comunidade, ou apenas elogios; 16% estão compartilhando uma ocasião especial, a qual foi comemorada com uma refeição ou prato especial, 12% é pura arte, a mesma coisa que Giuseppe Arcimboldo ou Paul Cézanne faziam séculos atrás, aqui busca-se aliar o alimento à arte com a finalidade de se inspirar os outros, ou transmitir alguma emoção, ou apenas compartilhar uma coisa bonita; e os últimos 10% estão compartilhando um bom momento com a família ou amigos, para o qual utilizam a comida como elemento de socialização, esse grupo de certa forma une-se aos 16% que compartilham a ocasião especial.[4]

Essa imensa capacidade de comunicação que a comida apresenta é por sua vez apreciada e reconhecida pela economia formal tradicional, a qual procurará fazer uso e apropriar-se. É importante frisar que o conceito de apropriação não está relacionado tanto à propriedade, mas sim ao direcionamento do uso da imagem (Amadeu; Santana, 2007). As empresas sabem que monopolizar as imagens não é viável, é melhor pegar carona no compartilhamento e atingir o maior número possível visualizações. Isso é verdade se o que se está compartilhando é positivo para o produto, caso contrário vale a regra tradicional de propriedade e busca-se retirar a imagem de circulação.

http://www.giuseppe-arcimboldo.org

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Quanto mais espontâneo for o compartilhamento da imagem que contém um determinado produto, melhor será para seu fabricante, tanto no que diz respeito à presença da marca na mente dos consumidores, quanto no que diz respeito ao custo, uma vez que será uma propaganda gratuita. Acredito ser possível dizer que um dos objetivos das áreas de marketing atualmente é ter um post de Facebook, Flickr, ou Instagram que torne-se um viral.

 

[1] De acordo com Wikipédia: natureza-morta é um tipo da pintura e da fotografia que retrata seres inanimados: como frutas, louças, instrumentos musicais, flores, livros, taças de vidro, garrafas, jarras de metal, porcelanas, dentre outros objetos. Esse gênero de representação surgiu da Grécia Antiga, e também se fez presente em afrescos encontrados nas ruínas de Pompéia. A denominação Natureza morta, conforme o alemão Norbert Schneider, surgiu na Holanda no século XVII, nos inventários de obras de arte. A expressão competiu durante algum tempo com natureza imóvel e com representação de objetos imóveis no século XVIII

[2] Giuseppe Arcimboldo (Milão, 1527 – 1599) foi um pintor italiano, suas obras principais incluem a série “As quatro estações”, onde usou, pela primeira vez, imagens da natureza, tais como frutas, verduras e flores para compor fisionomias humanas. A partir de 1562 morou em Praga, então capital do reino da Boêmia e hoje da República Tcheca, onde consolidou sua carreira como artista. Serviu na corte de Fernando I e de seus sucessores, Maximiliano II e seu filho Rodolfo II, grandes mecenas. Arcimboldo foi admirado como artista pelos três monarcas, tornou-se pintor da corte e chegou a ser nomeado Conde Palatino.

[3] Jornal da Manhã, 23/01/2014, Disponível em: http://www.jmonline.com.br/novo/?noticias,22,ARTICULISTAS,90235. Acesso em:16 Jun.2014.

[4] Disponível em: www.360i.com/reports/online-food-photo-sharing-trends/. Acesso em: 02 junho.2014.

 

 

BIBLIOGRAFIA

AMADEU, Serio; SANTANA,Bianca. Diversidade Digital e Cultura in Seminário Internacional sobre Diversidade Cultural: práticas e perspectivas, 2007, Brasília. Disponível em http://diversidadedigital.blogspot.com.br. Acesso em 02 junho 2014.

MORAES, Denis. Comunicação Alternativa, Redes Virtuais e Ativismo: Avanços e Dilemas. Revista de Economía Política de las Tecnologías de la Información y Comunicación, Vol. IX, #2, mayo-ago/2007. Disponível em www.eptic.com.br. Acesso em: 02 junho 2014.

BENJAMIN, Walter. A Obra de Arte na Era de Sua Reprodutibilidade Técnica (Primeira Versão). Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo: Editora Brasiliense, 1985.

RECUERO, Raquel. Redes Sociais na Internet. Porto Alegre: Editora Sulina, 2009.

SHIRKY, Clay. A Cultura da Participação – Criatividade e generosidade no mundo conectado. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.

16/06/2014

Programação cultural on-line

Filed under: Fernanda Portela — Tags:, , , — mfeportela @ 20:20

Por Maria Fernanda Bienhachewski da Costa Portela  

           

            A visitação a museus nunca esteve tão acessível. O site “ Era Virtual – Museus” é um projeto criado em 2008 e promove a visitação virtual de algumas instituições culturais brasileiras, visando despertar o interesse do público, divulgando via web os acervos de alguns museus brasileiros. Segundo os idealizadores, trata-se de um site interativo em constante atualização. A estratégia utilizada por eles é apostar em uma linguagem simples e de fácil comunicação com o público escolar, através de um acesso democrático via web. Contando também com a distribuição gratuita de Dvd-rooms aos interessados. A vista on-line de um espaço real, através da Internet também se preocupa em oferecer uma experiência cultural aos internautas.

Hoje em dia, museus tem investido bastante em seu departamento educativo, a fim de aproximar a arte do público, sendo comum realizar além da visita mediada, uma série de oficinas e atividades lúdicas. Na visita on-line isso não é diferente, pois também são oferecidos jogos educativos e interativos que complementam a atividade.

“O ERA VIRTUAL tornou-se uma rede de museus virtualizados e uma iniciativa referencial no processo de sua utilização do museu como material didático não-formal dentro das escolas. ” (trecho retirado da apresentação do site, disponível em http://www.eravirtual.org/ )

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            São inúmeras instituições que aderiram ao projeto, em alguns estados do Brasil, tal como Minas Gerais, Goiás, Santa Catarina e Rio de Janeiro. Essa experiência on-line só pode ser possível nos dias de hoje, em que vivemos num período de intensa digitalização.

            O grupo Google também lançou seu projeto, o “Art Project” que permite ao usuário visitar uma série de museus através de um aplicativo semelhante ao “ Google Street View”, que fornece imagens reais de ruas e avenidas de qualquer localidade. Através desse aplicativo, conectado diretamente as ferramentas do Google, o usuário pode não só visualizar o acervo em imagens de alta definição como também fazer uma espécie de Tour virtual pelas salas de exposição. Iniciado em 2011, o projeto conta com célebres museus tais como o The Metropolitan Museum of Art e MoMA, em Nova York, The State Hermitage Museum, em São Petersburgo e Van Gogh Museum, em Amsterdã entre outros.

A visita on-line é uma alternativa para os apreciadores de arte que estão a quilômetros de distância dos museus que desejam conhecer. Segundo Amit Sood, autor do aplicativo, câmeras profissionais fotografaram a parte interna dos museus, dando ainda mais veracidade a essa experiência virtual, que visa uma maior democratização do conteúdo artístico sem que haja a necessidade de pagamento de ingressos nem o deslocamento ao local.

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Segundo o antropólogo francês, Pierre Bourdieu, os indivíduos possuem o que ele chama de capital cultural, ou seja, um conjunto de qualificações intelectuais adquiridas através do convívio social na família e na formação educacional. O conceito de capital cultural está ligado a um outro conceito desenvolvido por ele, o habitus. Segundo o antropólogo, habitus é um princípio pré-disposto, construído histórico e coletivamente de acordo com a classe social dos indivíduos. É o que irá pré dispor alguns indivíduos a adquirir práticas e ações específicas ligadas, por exemplo, a vivência cultural.

Ou seja, segundo o autor, no livro “O amor pela arte”, publicado originalmente em 1966, o apreço por obras de arte está ligado ao conceito de habitus  e determinado por questões sociais. O amor pela arte não está apenas ligado a preferências estéticas de ordem subjetiva. Segundo Bourdieu, o fato de uma determinada pessoa frequentar museus não ocorre apenas por ela afirmar gostar de frequentá-los. Segundo esse livro, uma pesquisa minuciosa que busca compreender e analisar quem é o público frequentador dos museus da Europa, em países tal como França, Espanha, Grécia, Itália, Holanda e Polônia, os conceitos de habitus e capital cultural podem traçar o perfil dos frequentadores dos museus europeus. Sendo eles, na maioria dos casos indivíduos com maior nível de instrução educacional, que tenham tido algum tipo de contato com arte durante a infância. Segundo Bourdieu, crianças que frequentaram museus em companhia dos seus pais tendem a ser visitantes assíduos no futuro. Isso porque se cria um laço de familiaridade com a prática da visitação a espaços culturais. Segundo Bourdieu, o sistema educacional meritocrático é o maior responsável por enaltecer as desigualdades em relação ao acesso à cultura. 

Apesar do antropólogo francês acreditar que o hábito de frequentar museus está ligado a trajetória educacional e familiar dos indivíduos, sendo portanto, uma construção social; a expansão das visitações online a museus pode auxiliar ao combate dessa desigualdade cultural. De modo que a visitação on-line é mais democrática e acessível, por ser feita via web e sem a cobrança de taxas ou ingressos.

 Segundo a doutora em Ciência da Informação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro ( UFRJ), Rosane Maria Rocha de Carvalho, a Internet permite que usuários dos mais diversos lugares do mundo possam visitar em um mesmo dia uma série de museus, localizados em diferentes localizações, através do uso do computador. Os sites, em geral, são reproduções dos espaços físicos dos museus. Fato recente, os museus virtuais, ou também museus on-line tem em torno de doze anos de existência. Também chamados de museu eletrônico, digital, hipermuseu, cibermuseu e também web museu, trata-se de uma nova forma de vivenciar a experiência artística e cultural. A ideia é ter acesso a um museu sem limites geográficos, sem tempo de funcionamento, em que o visitante on-line possa cada vez mais, visualizar de forma ilimitada os acervos e obras. No entanto, o museu virtual não pode ser exatamente equivalente ao museu do espaço físico, que não pode ser por ele substituído, simplesmente pelo fato de que no museu virtual há apenas projeções, visualizações dos objetos em exposição. Apesar disso, o projeto de criação de museus on-line tem seus pontos positivos, pois busca democratizar o acesso às exposições e aos acervos dos museus físicos, permitindo um maior contato com o público, de modo interativo, além de proporcionar uma experiência continuada, através da realização de redes de discussão on-line. A digitalização do conteúdo cultural e patrimonial é de extrema importância para o futuro da humanidade, mesmo que ainda alguns museus mais tradicionais ofereçam certa relutância no debate dessas sites e ferramentas via web. Além disso, alguns sites como o do Fine Arts Museum em São Francisco, além do tour on-line e da visualização das obras, ainda oferece uma ferramenta, na qual, o visitante virtual pode ser o curador de sua própria exposição. Essas e outras atividades interativas enriquecem a experiência do internauta, podendo ser executadas apenas no meio virtual.

Apesar da tese de Pierre Bourdieu, na qual, o hábito de frequentar museus está ligado a uma construção social associada a trajetória dos indivíduos e de suas classes, o museu virtual vem como uma alternativa para aqueles que desejam penetrar no meio cultural e artístico sem custo, através do espaço ilimitado da Internet. Além disso, é uma forma de inserir os jovens estudantes, que vivenciam de modo intenso a era digital, ao mundo museológico, podendo ser ele muito mais atrativo e interativo.   

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Referências Bibliográficas

 

BOURDIEU, Pierre & DARBEL, Alain. O Amor pela Arte  São Paulo, EDUSP e             Ed. Zouk, 2003.

 

CARVALHO, Rosane. Comunicação e informação de museus na internet e o visitante virtual. XIII Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação – XIII ENANCIB, 2012.

Disponível em:  http://revistamuseologiaepatrimonio.mast.br/index.php/ppgpmus/article/viewFile/8/4

 

Sites consultados:

 

http://www.google.com/culturalinstitute/project/art-project?hl=pt-br

(Acesso em 02/06/14)

 

http://www.eravirtual.org/pt/ (acesso em 01/06/14)

 

 

15/06/2014

Funk ostentação: as mediações digitais de uma produção cultural popular e independente

Para começar falando de funk ostentação, retomo as palavras de Hermano Vianna: “No funk, o que era “carioca” ganha sotaque paulistano e vira ostentação, gerando milhões de views no YouTube e shows lotados em todo o Brasil, mesmo sem discos ou divulgação nas rádios”.

O funk sempre foi um estilo musical de pioneirismo na produção independente. O funk carioca deu um baile: um baile na indústria cultural mostrando como é possível se divulgar, se promover e acontecer através de meios alternativos. Equipes de som de grande qualidade montadas, bailes de rua, bailes em barracões nas favelas. O Funk carioca ganhou as periferias do país.

O funk criou, desde sua consolidação nos anos 80, um circuito pioneiro de produção, circulação e consumo relativamente autônomo e sustentável em relação ao modelo das grandes gravadoras (SÁ e MIRANDA, 2011).

Ele já tem essa característica de divulgação autônoma, mas hoje, diante do cenário tecnológico que vivemos, é possível alcançar outros níveis de produção e divulgação. SÁ e MIRANDA continuam: trata-se de música para dançar, com graves acentuados pelas caixas de som, cujo valor estético deve ser apreciado nas pistas. O funk ostentação/paulista mudou esse cenário; o valor estético não é mais apreciado primordialmente nas pistas. Konrad Dantas, famoso produtor de videoclipe e criador da estética da ostentação explica no documentário Funk Ostentação – O filme : “Aí surgiu uma nova… um novo segmento pro funk né, a galera começou a entender que se não fizesse videoclipe ia ficar pra trás, o público começou a cobrar. E hoje os MCs do Rio de Janeiro já tão procurando a gente já. A galera tá impressionada, a galera quer saber como é esse lance, como que a galera de São Paulo atingiu toda essa massa”.

Como a maioria já conhece, funk ostentação é uma vertente do funk carioca que tem como temática o que o próprio nome já diz. O foco é ostentar, exaltar o consumo, roupas de marca, carros, motos, bebidas caras, mulheres…

Hoje, o videoclipe, ou melhor, o webclipe tem uma importância que antes não tinha. O público não quer apenas ouvir os MCs falarem de consumo, de mulheres, de ostentação, o público quer ver tudo isso, querem ver os iates, os passeios que são narrados em Angra dos Reis, as festas. A narrativa é acompanhada da imagem em movimento.

Também chamado de funk paulista, por ter sido criado em SP, o funk ostentação já iniciou seu processo de produção através da internet. Gravar uma música de forma caseira tornou-se mais fácil com os programas que existem hoje e após isso, é só postá-la no Youtube (existem outras redes, mas os funkeiros costumam postar suas músicas no Youtube). Agora, as referências não eram mais cariocas apenas, São Paulo também passou a produzir funk.

A mídia utilizada também mudou. O CD não tem mais importância. O que sustenta essa produção atualmente é o arquivo em MP3, MP4 e outros formatos e como disse Vianna, os views no Youtube.

Para compreender melhor esse processo, fiz o que Reguillo classifica como “navegação errante”, método de pesquisa onde não se percorre um caminho já delimitado, uma linha reta e sim percebendo as próprias tramas que são traçadas nessas redes; podemos estar em uma determinada página e por meio desta ir para outras e depois, através das outras, podemos voltar para a mesma em que estávamos no início. Não é um movimento circular, a internet e suas conexões são complexas e diversas demais para reduzi-la a um círculo, ela forma exatamente o que o nome diz: redes.

Em meu Facebook, sigo várias páginas de MCs e de organizadores de rolezinhos como Duda Mel Delambers, MC Chaveirinho, Yasmin Oliveira, Juan Carlos Silvestre (Don Juan).  Eles têm o hábito de postar vídeos de músicas, se auto-divulgando ou divulgando outros artistas, vídeos estes que estão no Youtube e tem seu link postado na página do Facebook. Tornando assim, o Facebook um mediador (REGUILLO, 2012).

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Esses atores tem o chamado capital social, categoria de análise que RUCUERO leva para a cultura digital tendo como referências os estudos de Coleman, Putnam e Bourdieu. Ela explica o capital social como um conjunto de recursos de um determinado grupo que pode ser usufruído por todos os membros do grupo, ainda que individualmente, e que está baseado na reciprocidade e está embutido nas relações sociais. É como se esses atores fossem detentores das referências culturais legítimas e aquilo que é postado por eles, se não tiver concordância (embora a tendência é que aquilo que é compartilhado por eles seja sim legitimado pelo grupo), ao menos terá grande repercussão, visibilidade, pois eles são populares.

Mas não é somente pelo fato de serem populares que eles possuem capital social. Ou melhor, eles são populares por corresponderem aos padrões legitimados pelo grupo: estético, de valores, de gostos.

Isso relaciona-se com a divulgação das músicas pela rede. Cada usuário torna-se um autor de sua trilha sonora, cada um torna-se seu próprio DJ (e influencia os seus seguidores e amigos na rede) e através da opção “compartilhar” um vai de encontro aos outros, alimentando suas trilhas sonoras mutuamente.  As redes sociais, a internet funciona como mediadora e configuradora de novas mediações na produção de sentido para esses indivíduos e divulgando os artistas do funk nesse meio. (REGUILLO, 2012)

Kondzilla com um ano de carreira tinha cinquenta videoclipes e mais de 80 milhões de exibições no Youtube e ele mesmo reforça: “Falando em números, é brutal a aceitação. Não sou eu que to falando, isso é comprovado estatisticamente lá no Youtube”.

Assim como falei no início sobre as equipes de som qualificadas, nesse gênero, o funk paulista é pioneiro em produção audiovisual independente de qualidade. Pensar na cena cultural atual, é pensar em videoclipe, em trabalhar com o imaginário estético do público através das telas, é preciso de recurso e de técnica audiovisual. E essa galera tem. Os recursos tecnológicos atuais, as redes sociais possibilitaram além da divulgação e promoção dessas produções culturais, a prova de que o funk paulista/ostentação é muito popular, que caiu no gosto do público jovem do Brasil inteiro e nem só dos jovens periféricos.

Hoje, vemos MC Guime indo para Hollywood e com música tema de abertura de novela da Rede Globo. Vemos os MCs fazendo show em casas como Credcard Hall. Vemos entrevistas e matérias sobre funk ostentação em vários programas de várias emissoras de TV. O funk ostentação que começou como produção cultural independente está sendo apropriado pela indústria cultural, ganhando mais legitimidade, perdendo autenticidade e sendo conhecido no mundo inteiro.

Não se sabe quais serão as mudanças para seu formato original diante disso, mas se sabe que foi e é um movimento periférico, popular que foi capaz de ganhar muito sucesso por si só, tanto sucesso que hoje até a mídia hegemônica sabe que precisa dele para continuar agradando seu público, embora, contraditoriamente, apesar dessa glamourização toda, o funk ainda não deixou de sofrer discriminação e de ser estigmatizado pela sociedade.

REFERENCIAS

Funk Ostentação – O filme. Direção: Renato Barreiros e Konrad Dantas. Produção: Kondilla. e 3k Produtora. São Paulo – SP. 2012. Disponível em: http://vimeo.com/53679071. Acesso em 15/06/2014

REGUILLO, Rossana.  Navegaciones errantes. De músicas, jóvenes y redes: de Facebook a Youtube y viceversa  in Nueva época, núm. 18, julio-diciembre, 2012. (Departamento de Estudos de la Comunicacion Social. Universidad de Guadalajara).

RUCUERO, Raquel.  Redes sociais na internet.  Porto Alegre:                      Sulina, 2009. (Coleção Cibercultura)

SÁ, Simone Pereira de. e MIRANDA, Gabriela. Aspectos da economia musical popular no Brasil: o circuito do funk carioca. In: HERSCHMAN, Micael (org). Nas bordas e fora do mainstream musical. Novas tendências da música independente no início do século XXI. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2011.

VIANNA, Hermano. Funk paulistano. 11/01/2013. Disponível em: http://hermanovianna.wordpress.com/2013/01/12/funk-paulistano/. Último acesso em: 15/06/2014

09/06/2014

Produtor, ouvinte, podcaster: novas mídias e comunidades de colaboração em ambientes digitais

Filed under: Igor de Andrade — Tags:, , , , — igorandrade @ 02:01

A comunicação é um elemento essencial para a manutenção do ser humano, enquanto ser cultural e social. Os meios de comunicação foram desenvolvidos para sistematizar essa necessidade de transmitir significado e informação, sempre com “nobres intenções” no início e tendem a se instrumentalizarem para algum propósito pouco claro, na maioria das vezes (DOWNEY, 2004: 272). O rádio surgiu na América Latina ou, mais precisamente, foi importado para essa região durante o período de 1930 e utilizado por líderes políticos com o principal objetivo de criar uma cultura nacional comum, nessa época ainda ausente nos territórios nacionais, recém estabelecidos e com muito pouco em comum, dada a grande quantidade de grupos (étnicos, culturais, territoriais) distintos que coabitavam esse continente antes da colonização europeia. A tecnologia e o aparelho de rádio, naquela época, simbolizavam a modernização, exemplificada na tecnologia de comunicação e serviu para cristalizar uma cultura sobre um território, construir e legitimar o conceito de “nação” (MARTIN-BARBERO, 2004: 194), além significar uma nova tecnologia de imprensa, posterior à mídia impressa, ainda assim uma “mídia de massa”, conceito esse determinante na cultura do século XX.

Em meados de 1960, uma nova mídia, a Televisão, é trazida juntamente com o conceito de “desenvolvimento” para a América Latina, em um contexto de esgotamento da tendência política chamada “populismo” e fortes pressões internacionais por abertura econômica por parte dos países subdesenvolvidos. Essa nova tecnologia serviu, juntamente com o cinema, para criar um imaginário comum de consumo, não mais local ou nacional, mas global (transnacional): os valores, a cultura e os padrões de consumo dos EUA foram exportados e multiplicados, inclusive nos países mais “atrasados” (MARTIN-BARBERO, 2004: 196), recém industrializados, onde a população migrava das áreas rurais para as urbanas, esse consumo de mídia foi ainda maior, considerando a dificuldade de adaptação dessas populações e sua inexperiência em utilizar o tempo livre nesses ambientes tão diferentes e, de certa forma, hostis (SHIRKY, 2011:10).

Durante o séc. XX a comunicação e suas tecnologias eram largamente utilizadas para fins políticos de integração cultural e econômica, mas no contexto da guerra fria e ameaça constante de uma 3ª guerra mundial, sob a justificativa do desenvolvimento tecnológico dos EUA e a partir de fatores institucionais e políticos, é idealizada, depois viabilizada tecnicamente uma nova tecnologia de comunicação*, um espaço aberto para participação que foi se expandindo do local/ institucional até se tornar global: a internet. Pessoas com interesses específicos passam a ter um ambiente para compartilhar inquietações e ideias, pois certamente alguém possui o mesmo interesse, porque essa possibilidade é multiplicada pela quantidade de pessoas com acesso à internet, ou, como diz Clay Shirky: “Qualquer acontecimento [ou interesse] humano, por mais improvável que seja, vê sua probabilidade crescer numa multidão” (SHIRKY, 2011: 28). A virtualidade mostra uma série de conexões autônomas (redes) entre pessoas e/ ou grupos. Nos locais onde o espaço público das cidades não é utilizado para exercício da cidadania, os atores sociais se tornam autônomos de forma a criar espaços virtuais (horizontais e não hierárquicos) de conversa e deliberação, tomada de decisão, independente das empresas ou do Estado , culminando em ultima instância em espaços de reivindicação, que se estende aos lugares presenciais, vividos, cotidianos (CASTELLS, 2013: 11). Os indivíduos unidos em nações (por meio da ficção de pertencimento único ao território) se deparam com a diversidade, primeiramente no interior do próprio país (as particularidades regionais (na América Latina: diversas tribos indígenas e outras culturas ligadas ao espaço físico); se deparam com milhares de manifestações em nível global, das imensas possibilidades embutidas no contato com outras culturas e a multiplicidade de significados e significações que podem existir, dessa forma ameaçando os poderes centralizadores e homogeneizantes da sociedade( LEMOS E LEVY, 2010: 207).

A partir das novas possibilidades de conexão e estabelecimento de redes entre pessoas ou grupos agora possíveis por conta da internet, destaco certo tipo de mídia que é uma junção de outros formatos, ainda assim diferente de todos eles: um rádio que não é rádio, um meio possibilitado apenas a partir da internet: o Podcast, termo esse utilizado pela 1ª vez em 2004, pela junção das expressões “P.O.D – Personal on demand” (pessoal sob demanda) e “Broadcast” (transmissão massiva). Poderia também se chamar audiocast, o sentido da expressão é, para uso nesse artigo, conteúdo em áudio / video que pode ser distribuído massivamente, para grande quantidade de pessoas, nos moldes do rádio e que pode ser produzido por qualquer um com conhecimento técnico, uma ideia e disposição para fazê-lo, ou seja, uma ruptura na crença e prática de que só uma elite (executivos e técnicos dos meios de comunicação) era capaz de produzir conteúdo. Segundo Tom Webster:

“Podcasting é o conceito de baixar várias formas de programa de áudio/ vídeo na forma de arquivos digitais que podem ser ouvidos a qualquer momento.
Podcasting não se refere ao ato de baixar músicas individuais. Podcasting se refere ao ato de baixar arquivos de áudio/ vídeo on-line na forma de programas
(como talkshows ou um programa musical com apresentador), geralmente como um download automático que pode ser ouvido segundo a conveniência do usuário”

(WEBSTER, 2009: 9)

Podcasting

Um podcast pode ser produzido por alguma emissora de rádio, por exemplo, e de fato foi como a mídia se iniciou, mas seu modelo de produção deriva de diversos aspectos culturais da sociedade que foram potencializados na internet: Transparência na construção e divulgação do conhecimento, produção horizontal e democrática, comportamento comunitário / colaborativo, tanto no sentido metodológico / técnico de se produzir um programa, quanto nas temáticas e assuntos de interesse dos diferentes grupos. No interior de uma tendência geral da internet, de democratizar a produção e consumo da informação, esse tipo de nova mídia significa a potência de transformação de cada um em ator social (produtor da sua própria narrativa) e apropriação de diversas ferramentas tecnológicas que permitem tirar o máximo proveito das possibilidades multimídia da internet. Essas características se mostram principalmente no interior do universo que se formou a partir dessa mídia (produtores e consumidores, ou podcasters e ouvintes). Esse comportamento comunitário também destoa da hostilidade e concorrência da mídia tradicional, o corporativismo e preferência por viabilidade comercial à qualidade do conteúdo, características recorrentes nos meios de comunicação de massa, muitas vezes megacorporações com grande poder econômico, que atuam massivamente criando articulações (redes) de luta pelo poder**, a manutenção do mesmo e apoio de quem o detém (CASTELLS, 2013: 10).

Essa nova mídia, já produzida em grande quantidade no mundo inteiro, ainda pouco conhecida no Brasil, apresenta inúmeras possibilidades de produção, no momento se apresenta majoritariamente como conversas entre amigos, apresentador e convidados ou mesmo monólogos (o apresentador que lê / comenta), abordando uma temática preestabelecida, que pode ser tecnologia, esportes, notícias ou algum aspecto da cultura, local ou internacional (temática predominante). Esse tipo de produção, além de promover o debate em torno de algum assunto ou obra artística, contribui ao colocar em contato o entusiasta / especialista em alguma área (cinema, histórias em quadrinhos, música, por exemplo) com o restante da “audiência”, que muitas vezes não possui tanta informação a esse respeito, ou seja, dissemina conhecimentos históricos e ferramentas para um aprofundamento crítico, para quem não possuir. Além disso, a própria audiência (ouvinte) cria uma atmosfera de participação, com referências que não foram citadas, opiniões pessoais e demais contribuições, que invariavelmente enriquecem o conteúdo. Isso tudo, produzido, cristalizado e disponibilizado na internet, é gravado em formato de áudio (.mp3) e enquanto estiver disponível, aquele conteúdo se manterá intacto, podendo ser consultado novamente quantas vezes for necessário, e significa, afinal, para quem produz esse tipo de conteúdo, algum custo de produção e muito pouco para reprodução, cópia ou compartilhamento, além dos conhecimentos prévios sobre os assuntos, altamente valiosos, mas dificilmente mensuráveis, e infinitamente combináveis entre a comunidade que, quanto mais ativa, mais viva e criativa se mantém.

Existem os podcasts que se pretendem comerciais, se inserem em portais mais amplos como blogs e outros produtos para comércio ou veiculação de propaganda, nos moldes da mídia tradicional, por medição da quantidade e nível de engajamento da audiência, o que possibilita a venda de publicidade e outros produtos, por isso acabam adotando estratégias de comunicação massiva, temáticas populares, mas no ambiente da internet possuem a vantagem de ter um custo de produção muito menor do que em um grande estúdio de TV ou rádio, além de uma maior segmentação e fidelidade do público, considerando a imensidão de possibilidades, já que todos são potenciais produtores de conteúdo. Ainda assim, ponderadas as particularidades, essas estratégias reproduzem em outro meio o modelo hegemônico de mídia. Outros programas abordam temas mais alternativos, de baixo apelo à mídia de massa ou à população em geral (Cinema de arte / independente, mitologia), história, o que não significa necessariamente menos interesse ou participação.

Ainda assim, existem muitas possibilidades, ainda mais no contexto da América Latina, onde as tecnologias foram implantadas, mas muito pouco apropriadas pela população (MARTIN BARBERO, 2004: 179). Considerando-se a multiplicidade de culturas que coexistem no continente, existe um imenso potencial para abordagem das culturas indígenas, de forma a tornar pública sua existência e realizar o resgate histórico de práticas que podem ter se perdido no tempo ou no contato com os europeus, além das culturas tradicionais que foram extintas pela urbanização e/ou exploração indevida dos territórios. É possível e necessário apropriar-se dessas novas tecnologias multimídia como mídia radical: construir novas práticas de produção e reprodução da informação, novas formas de organização do conhecimento e sua apropriação pelas pessoas: uma comunicação não mercantilizada, que não atenda aos interesses de parcelas da sociedade (notadamente aquelas que detém o poder). “Consiste na participação das pessoas na criação de formas interativas de comunicação que atuam como força de compensação para o fluxo unilateral que é próprio da mídia comercial” (DOWNEY, 2004: 274), dessa forma, abre-se espaço para temas sem repercussão na mídia tradicional, seja por falta de repercussão ou divergência ideológica: mídia e cultura independentes / colaborativas, movimentos sociais contra-hegemônicos, conteúdos críticos/ antissistêmicos, novas formas de organização social. Assim como o rádio foi utilizado na Argélia para fins da independência do país, ou em Lima, nas rádios comunitárias que deram voz às vendedoras nos mercados , ou os latinos residentes nos EUA que viajam para seus países de origem colhendo, com gravadores, as manifestações das festas populares para atualizar os companheiros que moram longe (MARTIN BARBERO, 2004: 189-190), é possível apropriar essas tecnologias para valorizar as diferentes manifestações humanas dos países/ continentes.

Mesmo sendo uma mídia recente, o podcast demonstra um potencial imenso em diversos aspectos, seja na popularidade que o rádio já teve, na conveniência em se consumir conteúdo em áudio, seja na facilidade de produção e distribuição do conteúdo. Diversas outras ferramentas da internet possibilitam a valorização cultural de povos isolados ou marginalizados, como a gravação em vídeo de rituais, cerimônias e outras manifestações, posteriormente disponibilizado em serviços de streaming, o rompimento das barreiras de tempo / espaço, em que não é mais preciso a proximidade física para a comunicação direta e articulação política, ou mesmo as possibilidades educacionais: ensinar a apropriar a população para que se utilize desse espaço, virtual, mas em muitos momentos público e participativo, de mobilização e efervescência cultural, pois em ultima analise, não são os “impactos” das tecnologias, mas seus usos, que realmente interferem e fazem a diferença na sociedade.

Notas:
* No contexto da época, os principais fatores foram: o apoio financeiro (do governo dos EUA); institucional (pelo departamento de Defesa) e autonomia proporcionado para a discussão e desenvolvimento de ideias; a genialidade dos cientistas envolvidos desde o início e os estudantes que se juntavam posteriormente; além dos fatores externos, que influenciaram ideologicamente nas características finais do projeto: as culturas alternativas e libertárias dos anos 60 e 70, além dos idealistas como Tim Berners-Lee, Douglas Engelbart e Ted Nelson. Castells (2004), pg. 40-43

** Utilizo o conceito poder de acordo com a formulação de M. Castells: “O poder é exercido por meio da coerção (o monopólio da violência, legítima ou não, pelo controle do Estado) e/ ou pela construção de significado na mente das pessoas, mediante mecanismos de manipulação simbólica” e ainda: “[...] as relações de poder são constitutivs da sociedade porque aqueles que detêm o poder constroem as instituições segundo seus valores e interesses.” (Castells, 2013: 10)

Bibliografia:

Castells, Manuel. A galáxia internet: Reflexões sobre internet, negócios e sociedade. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2004

Castells, Manuel. Redes de indignação e esperança: movimentos sociais na era da internet. Rio de Janeiro, Zahar, 2013

Downey, John. Mídia radical: rebeldia nas comunicações e movimentos sociais.São Paulo, Ed. Senac, 2004

Lemos, Andre; Levy, Pierre. O futuro da internet. São Paulo, Paulus, 2010

Luiz, Lucio (org). Reflexões sobre podcast. Nova Iguaçu, Marsupial Editora, 2014

Martin-Barbero, Jesus. Oficio de cartógrafo: Travessias latino-americanas da comunicação na cultura. São Paulo, Loyola, 2004

Shirky, Clay. A cultura da participação: Criatividade e generosidade no mundo conectado. Rio de Janeiro, Zahar, 2011

Webster, T. The Podcast Consumer 2009 . Edison Research, Disponível em: http://www.edisonresearch.com/home/archives/2009/05/the_podcast_consumer_2009.php#.U5UyIS1XC24. Acesso em 18/05/2014

04/06/2014

La Evolución de la Relación entre Arte y Tecnología

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En un momento de la historia, el color azul era la tecnología costosa. Un pigmento casi imposible de obtener, azul de ultramar sólo podría ser hecho con lapislázuli, una rara piedra semipreciosa que la mayoría de los artistas- por no hablar de artistas muertos de hambre- no podían permitirse (esta es la razón por azul y púrpura se consideran los colores de la realeza). Cuando los pigmentos artificiales irrumpió en la escena artística, de repente cielos estaban literalmente más azul y artistas se enfrentaban a una nueva paleta de opciones. Esto es lo que los artistas se enfrentan ahora con la aparición de las nuevas tecnologías: más herramientas, más opciones, y en algunos casos, nuevas maneras de estimular los sentidos del público.

Tecnología y Cultura

No hay duda de que la tecnología está cambiando el arte (http://www.bbc.com/news/entertainment-arts-19576763). Las computadoras le ha dadoes al arte nuevas formas de crear música, pinturas, poesía y escultura. Gracias al Internet, los artistas pueden compartir su trabajo con millones de personas- mucho más de lo que hubieran visto en una exposición en una galería. Pero no importa la forma en que usamos la tecnología, la mente humana siempre estará en el centro de arte, orientando las herramientas para crear la visión del artista.

El público está viendo una gran ruptura en cómo la gente usa los medios tradicionales hoy en día. Antes de lo que solía ser que alguien se acaba de hacer una escultura, pero ahora, se trata de una experiencia de instalación de rendimiento. Los géneros se están borrosas y se está creando este vocabulario totalmente nuevo en el mundo del arte de la forma en que el artista y el público definen diferentes medios. El público está viendo mucho más artistas que están rompiendo los límites de los medios de comunicación y que también están buscando fuera de los medios tradicionales de arte para incorporar otros aspectos en su trabajo.

La tecnología ha hecho el arte más accesible a su público, sino también al artista. “De fato, a interconexão dos epíritos, a inteligência coletiva e a abertura do espaço mental foram favoráveis á criatividade florescente da vida do sentido.” (Lemos e Levy , 2010:205) Algunos escultores ahora utilizan programas de la computadora para diseñar sus obras en un entorno abstracto antes de enviar sus especificaciones a cantería fábricas que dependen de equipos computarizados para cincelar una estatua. Pintores ya no tienen que cargar sus suministros con ellos si quieren crear una imagen fuera del estudio. Pueden sacar sus smartphones, abrir un programa/app y utilizar sus dedos como pinceles para crear pinturas magistrales. Estos artistas dicen que les gusta esta tecnología porque es inmediata; pueden capturar un momento en que sucede. También pueden compartir esos cuadros de forma rápida a través de los sitios de redes sociales.

Virtuo Art Tool Set de Yana Klimava

Esta accesibilidad creciente está rompiendo paredes. Tecnología al alcance de todos significa que el publico ya no ve en el arte como sólo para la clase elite. “Hoje, a internet está reduzindo o custo de transmitir não só palavras, como também imagens, videos, voz, dados brutoss e tudo mais que possa ser digitalizado..”( Shirky, 2011:127) Los artistas no se limitan a un solo medio. Producciones multimedia computarizados combinan la música y las artes visuales en impresionantes conciertos de vista y sonido que no fueron posible hace unos años.

La tecnología puede estar cambiando la forma de pensar del arte. En el pasado, el arte tomó formas físicas que podrían mantenerse en su estado original con el cuidado y la protección adecuada, pero el arte digital plantea nuevos problemas para la preservación y restauración: las convenciones de formato de archivo cambian, el software está en constante evolución, y los programas necesarios para abrir estas obras digitales con el tiempo se convertirá en obsoleto. Incluso si contamos con los programas, las computadoras del futuro no pueden ser capaces de ejecutarlos, y así se perderán las obras. Al mismo tiempo, muchos artistas digitales dicen que la transitoriedad de su trabajo es parte de su encanto. Tal vez la introducción de esta incertidumbre es otra manera como la tecnología está cambiando el arte.

Art Game de Leo Caillard

En última instancia, podría fácilmente argumentar que el arte no cambia, que la necesidad de expresarse es antigua y estática y eso sería un comentario legítimo. Pero cualquiera que sea el futuro depara para la tecnología y el arte se espera: no hay duda de que sus destinos están vinculados intrínsecamente.

 

 

 

Bibliografía

 

“ART GAME.” Behance. N.p., n.d. Web. 29 May 2014.

Shirky, Clay. “Cultura”. A cultura da participação: criatividade e generosidade no mundo conectado. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, pp. 119-143

“Guest Post: Technology And Culture. Which Is The Right Way?” Art Marketing Management. N.p., n.d. Web. 29 May 2014.

Lemos, André; Levy, Pierre. “O espaço virtual da cultura”. O futuro da internet. São Paulo, Paulus, 2010, pp. 115-155, 101-220.

“Tech & Art: Engineering the Future.” BBC News. N.p., n.d. Web. 29 May 2014.

“Tuvie.” Tuvie Virtuo Digital Art Tool Set by Yana Klimava Comments. N.p., n.d. Web. 29 May 2014.

03/06/2014

The Impact of Technology on the Music Industry

The music industry has come a long way since those days of the mono recordings. Before the music industry was simple. An artist would record a song on vinyl, cd, or tape and then the public would go to the store and purchase the album. Now, the music is stored in the cloud. You can see the music videos through YouTube, stream it through Spotify, or purchase it from iTunes. On top of that, all of this can be done through the home computer, phone, or the tablet, even in a car. The music industry nowadays is comprised of individuals who compose and perform music that work with huge label companies who in turn sell these music labels to the public. This whole business was worth around 168 billion dollars in 2013.

Back then, artists, producers, and engineers didn’t have as much of a choice of what equipment that would use to get their recordings done. With the advancement in technology and new innovations constantly being created in the music industry, the opportunities are endless. If you look up the definition of technology you will see the words industry and commerce, which just means growth and development. Technology has and will continue to influence growth and development in the music industry.

With the growth of technology, the technical end of producing and engineering has become somewhat a quicker task. For example, the introduction of system real time messages synchronized drum machines, sequences and other rhythmic devices. System real time messages are dropped into the data stream as required, and have priority over other messages in order to mainstream synchronization at all times. Other advances in technology have allowed these devices to operate with timing clocks so everything does not have to be done completely be hand anymore. As music production and recording systems become more complex and sophisticated, the need for intuitive, easy to use controls over then became essential if they are to be used effectively. In many ways, technology has improved the sound quality of the music that we hear, due to the advent of digital sound, and also advancements made for live performance. Music producers are now able to create more special effects on tracts.

Music Technology

However, many “performers” have become reliant on technology, and there are a lot of artists who now lip synch to all the songs when they perform “live”. This is a negative impact, because often it means that people actually need less talent to succeed in the business than they needed 20 or 30 years ago.

Technology also gave birth to the music video. The artist would create an image that would form an identity for fans to relate to. The result resuming to more and more profits for the artist and the record label companies. Similarly, more effects are now possible and there is an overall superior quality, which is getting increasingly better as more new and updated technology comes along.

Youtube’s Effect on Music

Technology has affected the music industry in both a positive and a negative way. The positive impact includes buying one song now, not the entire album if the fan prefers not to; the public has immediate access anywhere at anytime; and the public can also find exclusive tracks (like live performances) that are not available on regular albums. And, of course, technology has created overnight celebrities and will continue to do so.

Negatively, while technology allows music to be distributed all over the world at the touch of a button and enables artists to advertise on an unprecedented scale it also allows music to be pirated illegally anywhere, anytime. There has been a loss of profit due to illegal downloading. In 2012, 40 billion downloads were illegal, which was almost 90% of all the downloaded music (http://www.statista.com/chart/614/music-downloads-via-bittorrent-in-the-first-half-of-2012/). Additionally, artists may be judged on the video rather than their artistic abilities. And lastly, the purity of the music may be compromised due to the use of software to enhance the artist’s voice.

Music Piracy of 2012

The world has changed so much from a technological standpoint over the last years. And the way that’s affected music and content industries in general has been huge. But the world changes and the music industry must keep up with it. Artists starting out now have it a lot harder because there are so many choices to be made. “(As) novas ferramentas possibilitam uma oportunidade de criar novas culturas de compartilhamento e apenas nessas culturas (as) capacidades de compartilar terão o valor que podem ter.” (Shirky, 2011:129) But they have those choices and they can decide how much emphasis they are going to put on certain aspects.

The goal when artists start out now is exactly how it was when artists were starting out back then: to grow. To make great music, have a career, have a following, build a fan base, spreading popularity, etc. “Todos os tipos de imagens, musicas, textos, mundos virtuais se entrecruzam ai, em linguas cada vez mais numerosas e nas direções do espírito cada vez mais divergentes.” (Lemos e Levy, 2010:205) The bottom line is that technology is here to stay and the music industry should embrace it rather than fight it. At the end of the day, the only true musical experience is a live performance.

 

 

Bibliography

“Infographic: United States Top Music Piracy Ranking.” Statista Infographics. N.p., n.d. Web. 01 June 2014.

Lemos, André; Levy, Pierre. “O espaço virtual da cultura”. O futuro da internet. São Paulo, Paulus, 2010, pp. 115-155, 101-220.

“Music Technology BTEC Subsidiary Diploma.” - St. Wilfrid’s Catholic 6th Form College. N.p., n.d. Web. 30 May 2014.

Shirky, Clay. “Cultura”. A cultura da participação: criatividade e generosidade no mundo conectado. Rio de Janeiro: Zahar, 2011, pp. 119-143

01/06/2014

Crowdfunding – A Vaquinha da Modernidade

Por Jimmy M. Pitondo

Entre as muitas válvulas de escape em relação aos meios tradicionais que o uso da internet proporciona, podemos enxergar no Crowdfunding um dos fenômenos que mais crescem com as transformações de mercado engendradas por esse uso. O financiamento coletivo funciona como uma rota alternativa para todos que possuem ideias criativas e elaboram projetos artísticos, tecnológicos, acadêmicos, enfim, projetos para os quais seus criadores não têm dinheiro necessário para colocar em prática, ou seja, é uma forma interessante de driblar o empréstimo bancário ou o patrocínio das grandes produtoras, ainda que esse financiamento também passe pela mediação de organizações como: Catarse, Kickstarter, Ulule, KissKissBankBank, entre inúmeras outras. Assim, as famosas ‘‘vaquinhas’’ tão próximas ao nosso cotidiano, organizadas por grupos a fim de levantar fundos para qualquer objetivo, ganham uma nova roupagem no mundo virtual e um valor cívico real.

É o pesquisador estadunidense Clay Shirky (2011) quem nos mostra como as relações de mercado, entre outras formas possíveis, são um tipo de norma cultural que auxiliam as trocas de coisas ou informações entre os indivíduos. Dentro dessa arquitetura descentralizada da internet, essas normas culturais são modificadas ao longo do desenvolvimento de novas formas de relações mercadológicas. Agora nos cabe levantar algumas questões sobre o funcionamento dessas trocas nesse novo caminho, suas principais vantagens e, naturalmente, problemas em relação ao seu uso.

Primeiramente o financiamento coletivo esteve ligado ao cinema. Se lançarmos um olhar retrospectivo no tempo, especificamente em 1959, vamos encontrar John Cassavetes buscando o apoio dos nova-iorquinos para financiar seu filme Shadows, já nessa primeira tentativa a vaquinha obteve êxito. Mas há 50 anos quais eram os meios que John possuía? Eles estavam no rádio, nos jornais e no boca-a-boca. Já hoje, além dessa prática encontrar-se mais ligada ao campo da música e da tecnologia, nossos contemporâneos Cassavetes atuam principalmente nas redes sociais online, como Twitter ou FaceBook, onde em tempo real é possível estimular a curiosidade e o altruísmo dos internautas, dos seus amigos e amigos dos amigos em uma escala global. Essa dinâmica se afirma nessa nova cultura de comunicação, compartilhamento e difusão rápida de ideias. Os movimentos surgem e espalham-se por contágio através de redes de comunicação, seu impacto se evidencia quando olhamos a forma pela qual o poder se exerce na comunicação e na alternância entre várias redes, vemos então como esses movimentos carregam a dynamis necessária para transformações sociais, pois abrem novos espaços onde há transformação e superação de interesses e valores hegemônicos.

Manuel Castells (2013) explora essa questão de transformação social através dos movimentos sociais conectados em rede. Mesmo não sendo um movimento social propriamente dito, a prática do Crowdfunding surge como uma forma de contrapoder multimodal, por isso se torna possível aproveitar suas ideias sobre como essa organização em redes poder se tornar responsável por significativas mudanças sociais. Através da ampliação do alcance da comunicação que a internet proporciona, o surgimento de formas de financiamento coletivo pode então ser interpretado como um contrapoder em relação as grandes gravadoras ou aos órgãos de financiamento de pesquisa. Seu crescimento é exponencial, uma vez que ‘‘A constituição de redes é operada pelo ato da comunicação. Comunicação é o processo de compartilhar significado pela troca de informações’’ (CASTELLS. 2013:11)

Dentro desse universo de trocas, o idealizador do projeto é obrigado a ir além de sua função original, pois, para que obtenha sucesso em sua busca por investimentos é necessário saber interagir nas redes sociais online e ter capacidade de manter uma relação entre a rede que está inserido e as inúmeras outras adjacentes, função essa para a qual nem todos têm habilidades. Assim, por exemplo, ao invés do artista se limitar a fazer sua arte, deve encarnar o papel de empresário e demonstrar habilidade na comunicação alternativa, o que muitas vezes faz com que o mais habilidoso em marketing viral obtenha maior espaço de visibilidade, não necessariamente sendo o mais talentoso. Compreender o pensamento de Dênis Moraes (2007) acerca da comunicação alternativa é de suma importância para desenvolver essas habilidades necessárias:

A idéia de alternatividade fundamenta-se numa dupla inserção ideológica do projeto comunicacional: alinhamento com processos de mudança social: e o combate sistemático ao sistema hegemônico. Pressupõe assumir visões transformadoras na relação com os leitores e a sociedade em geral, nos métodos de gestão, nas formas de financiamento e, sobretudo, na interpretação dos fatos social. (MORAES. 2007:4)

Vejamos alguns dados para materializar o impacto no sistema hegemônico. O kickstarter fez um levantamento em 2013, seus dados indicam um investimento de mais de 400 milhões de dólares entre 3 milhões de internautas do mundo todo. Sendo quase 20 mil projetos bem sucedidos, entre eles, o Oculos Rift recentemente comprado pelo FaceBook por 2 bilhões de dólares. O que nos leva a inúmeras questões. André Senna, pesquisador do Atos – Comunicação e consumo: estudos de recepção e ética da ESPM, nos diz: ‘‘É interessante olharmos o caso do Oculus Rift. Ele foi financiado no Kickstarter, e deu tão certo que o FaceBook comprou há algumas semanas. Os apoiadores ficaram indignados e pediram reembolso! Mas e aí, Crowdfunding é doação ou investimento?’’ Assim como Clay Shirky mostra, quando criamos uma relação de mercado em cima de algo previamente fora dessa lógica, podemos modificar profundamente essas relações, nessa perspectiva os internautas deixam de ser somente apoiadores e podem se tornar co-produtores dos projetos, dessa forma essa relação passa de uma empresa compartilhada para uma transação de mercado

Muitas empresas tentam deixar clara essa linha entre doações e investimentos, assim como é feito pela empresa My Major Company que chega a oferecer um retorno financeiro em certos casos. Mas ainda assim enfrentou diversas críticas no âmbito da transparência em relação ao que é feito com o dinheiro e a chance de retorno do investimento. Organizações como Ulule e KissKissBankBank deixam claro que no caso do projeto não avançar, ou seja, não conseguir a quantia necessária, toda a operação é cancelada e o investimento devolvido aos financiadores. Com isso vemos nesse universo de financiamento coletivo uma pluralidade de situações e formas, com o surgimento de novas startups e os avanços da legislação sobre o tema, veremos um desenvolvimento profundo nesse tipo de ação. Agora, onde está o Brasil nesse universo?

Aqui em Pindorama é interessante notar a diferença do perfil dos apoiadores em relação ao exterior. Apesar de estarmos ainda engatinhando na compreensão da internet como uma ferramenta para além do trivial entretenimento, é possível enxergar um interesse maior em projetos culturais e sociais, enquanto no exterior o que prevalece são os projetos ligados a tecnologia e aos games, como no caso envolvendo o próprio criador do MegaMen em 2013, onde foram arrecadados via kickstarter quase 4 milhões de dólares para reviver o veterano jogo de ação. Já aqui também temos algumas organizações voltadas ao auxílio ao financiamento coletivo, entre elas, Catarse, Arrekade e a Vakinha Online. Em 2013 a banda Raimundos lançou seu último CD, Cantigas de Roda, com a ajuda de 1699 apoiadores e 123, 278 reais em contribuições, 68, 278 reais a mais do que o valor necessário para o desenvolvimento do projeto. Além de uma interessante vantagem relativa ao valor da contribuição, com 10 reais ou mais o apoiador ganhou o download antecipado e seu nome escrito na galeria dos apoiadores, 35 reais ou mais, todos os prêmios anteriores e mais o CD físico em casa; essa relação entre o valor doado e suas vantagens chegam até o patamar de 5 mil reais, no qual o indivíduo ganhou além dos prêmios já mencionados, um CD autografado, camiseta, Vinil, ingresso com backstage e camarim para qualquer show no ano seguinte com direito a acompanhante,entre inúmeros outros prêmios.

Dessa forma, esse é um universo cheio de possibilidades para ambos os lados, assim como Senna nos fala: ‘‘Cara, o Crowdfunding é uma ferramenta muito legal, senão a melhor, para tirar do papel ideias legais e desafiadoras que jamais iriam ao mercado por conta própria naquele momento. É uma forma de fazer arte e tecnologia que vai além do lucro por si só, pois, acaba engajando a comunidade. É um processo em amadurecimento: o surgimento do Kickstarter e Catarse mostram que o Crowdfunding pode ser mais que uma simples vaquinha virtual, e quando o processo se torna uma relação de troca, os resultados são bem melhores. Mas muitos ainda estão aprendendo a usar a ferramenta. Vejo o ceticismo aumentando nos próximos tempos, mas também vejo esse amadurecimento rolando. ’’ Naturalmente ainda há outras questões em aberto para discussões, o objetivo desse texto foi apenas ilustrar os principais pontos desse fenômeno em crescimento e, principalmente, evidenciar como o uso da internet através das redes acaba transformando por diversas formas determinadas relações sociais previamente asseguradas em contextos socioculturais e mercadológicos.

Contudo, qualquer tipo de conhecimento apenas ganha vida ao lado de mentes capazes de compreendê-lo, o uso desse conhecimento pelos brasileiros ainda em fase rudimentar, mostra como ainda é grande o caminho para melhorar o uso desse meio como uma ferramenta para reprogramar a organização econômica e cultural através de transformações sociais mais diretas e dinâmicas, condizentes com esse novo tempo de contrastes entre o velho e o novo na Modernidade, potencializado pela espontaneidade permitida pelos novos meios que possuem essa forma mais descentralizada e espontânea.

Bibliografia
CASTELLS, Manoel. Redes de Comunicação e Esperança: Movimentos Sociais na Era da Internet. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 2013.
DENIS, Jacques. Crowdfunding, a Corrente da Amizade In Le Monde Diplomatique Brasil. São Paulo: Ano 7, nº 81, 2014.
MORAES, Dênis de. Comunicação Alternativa, Redes Virtuais e Ativismo: Avanços e Dilemas In Revista de Economía Política de Economia Política de las Tecnologías de la nformación y Comunicación www.eptic.com.br, vol. IX, Nº 2, mayo-ago. 2007.
SHIRKY, Clay. A Cultura da Participação: Criatividade e Generosidade no Mundo Conectado. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 2011.

E-Links:

http://pesquisa.catarse.me/?ref=newsletter_pesquisa

https://www.kickstarter.com/year/2013/?ref=footer

http://catarse.me/pt/raimundos

https://www.kickstarter.com/projects/mightyno9/mighty-no-9

http://www.kotaku.com.br/oculus-rift-kickstarter-reembolso/

http://www.kotaku.com.br/kickstarter-nao-entregam-prometem/

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