Indignados: redes sociais em uso na Espanha

LUIZ BORGES

Desde 2008, tendo como motivo inicial a crise financeira que se abateu no mundo capitalista, diversos movimentos sociais, em protesto aos seus governos locais, eclodiram, sejam eles contrários aos mecanismos utilizados por seus governos na tentativa de solucionar os problemas trazidos pelas crises ou sejam eles partes de uma causa maior, como é o caso da Primavera Árabe, em que, junto com a crise financeira, se abateu também uma crise na governança, na medida em que a população se levantou contra as ditaduras e monarquias que governavam (Egito) ou ainda governam (Síria) o país.
É neste cenário de conturbações econômico-sociais que também se encontra uma grande nação capitalista ocidental, a Espanha.
A Espanha, assim como diversas outras nações, em resposta à crise financeira, adotou severas medidas de austeridade, que concomitantemente com a alta taxa de desemprego entre a população jovem, protestos em outros países da região (Grécia, Portugal, Islândia) e também o recém publicado texto de Stéphane Hessel, Indignai-vos!, levou a população a se reunir nas ruas para protestar.
A população, no caso da Espanha, descrita como “los desempleados, los mal remunerados, los subcontratados, los precarios, los jóvenes” pelo ¡Democracía Real Ya!, foi às ruas em um momento em que a taxa de desemprego atingiu os 20%, junto aos planos de austeridade impostos pelo governo e do resgate financeiro fornecido aos grandes bancos. Inicialmente o governo adquiriu uma postura tolerando com os protestos, porém com o decorrer dos eventos e o aumento no número de manifestantes, a polícia começou a usar de violência, gerando conflitos com os manifestantes.

(Manifestação do Movimento 15-M em Madrid. / fonte: El País. Foto: CARLOS ROSILLO)

(Manifestação do Movimento 15-M em Madrid. / fonte: El País. Foto: CARLOS ROSILLO)

Assim como o grupo Anonymous (que apoia o movimento dos Indignados), os protestos da Espanha se iniciaram na rede, especialmente no Twitter, como meio para a organização de movimentos de ocupação, porém diferente do Anonymous, que busca, inicialmente, uma maior liberdade na Internet, os Indignados, fazendo uso de certa liberdade já existente, se organizando em protestos contra o governo em si, como ocorrido recentemente em diversas cidades brasileiras.
Em um sociedade globalizada e intrinsicamente conectada, as redes sociais forneceram aos movimentos sociais modernos os meios para os quais eles possam, apesar da heterogeneidade da sociedade contemporânea, agrupar os indivíduos e, mesmo com objetivos e reivindicações diversas, sair da rede social e ir as ruas para mostrar a indignação popular, ou seja, o levante popular pode ser considerado em dois momentos, sendo um off-line e outro online. O momento online, que é basicamente onde começou a movimentação, teve como intuito articular os indivíduos, em que as informações dos acontecimentos deixou de ser gerida apenas pelas grandes mídias e corporações, mas sim pela população, por diversos estudiosos e analíticos, que fornecem visões alternativas para os acontecimentos, e posteriormente clamando por mudanças na governança. Um segundo momento, ainda online, seria a divulgação dessas diferentes informações e visões e o grande compartilhamento das mesmas com a grande população, altamente conectada, e a partir desse ponto sair do online e ir para o off-line. O momento off-line é o que gera a grande visibilidade para insatisfação, através das ocupações das grandes vias e órgãos oficiais.
O movimento de protestos na Espanha ficou conhecido como os Indignados, nome esse oriundo do texto de Hessel, que discorre sobre o fato de o levante da população ocorrer é a indignação do povo em relação às atitudes do governo. Em seu website, a plataforma ¡Democracía Real Ya! possui um manifesto, uma lista de grupos associados (para comprovar que o movimento não possui nenhum vinculo politico com partidos e/ou sindicatos etc.) e todos os objetivos do movimento, que, por se tratar de um movimento muito heterogêneo, possui variadas reivindicações, como a defesa de direitos sociais, e reformas governamentais em geral (reforma eleitoral, maior transparência etc).
O uso das plataformas digitais e das redes sociais foi o principal mecanismo para a organização do movimento, sendo o ¡Democracía Real Ya! a principal fonte de informações sobre os movimentos e principal meio convocatório para os protestos pacíficos, que possui um canal no site do YouTube, no qual possui campanhas e vídeos das manifestações, uma página também no Facebook, em que atualiza seus seguidores sobre novas articulações e também com informações a respeito de suas reivindicações e resultados, e também uma página no Twitter, sua principal plataforma social na web. Sua página do Twitter possui atualmente mais de duzentos mil seguidores e é uma conta verificada pela própria empresa do Twitter, o que confere uma maior credibilidade. Esta página serve para, além de promover e convocar as pessoas para irem as ruas, informar os cidadãos com informações relevantes para o movimento, como dados sobre impostos, segurança, saúde etc.

(poster convocatório do movimento ¡Democracia Real YA!)

(poster convocatório do movimento ¡Democracia Real YA!)

Esse tipo de organização, com esse uso especifico da rede com o intuito de alterar a forma com a qual o governo está tomando, cai de encontro com a definição do Manuel Castells, na qual ele define esses usuários, essa rede comunitária, como os ativistas sociais, os quais promovem “… a participação dos cidadãos numa tentativa de redefinir a democracia local.” (CASTELLS, M. p. 119) Esse tipo de rede, de organização social via Internet, é hoje em dia o meio mais utilizado com tal fim, particularmente importante em locais em que existe um controle governamental sobre as informações circuladas na web). É ainda, de acordo com Castells, um movimento que pode ser considerado como uma criação de um novo tipo de democracia. A movimentação gerada nas redes sociais de ocupação dos espaços públicos estaria, diz o autor, obtendo uma resposta errada dos líderes, que fazem o uso da violência e repressão policial, e em muitos casos até a ameaça de limitar o uso da internet, no entanto a população estaria, de maneira colaborativa, através das redes, criando seus próprios mecanismos de comunicação e articulação.
Apesar de esse não ser especificamente um movimento contra o capitalismo, é possível recorrer ao o que Dênis de Moraes escreve, especialmente no que tange a parte de uma proposta cooperativa com um ideal organizacional em que webmídias e redes sociais buscam um entrosamento de agenda de debates, conquistando apoio em locais diversos, adquirindo melhores mecanismos de pressão, com a intenção de alcançar os objetivos pelos quais o movimento luta. Tal proposta cooperativa só é possível dentro de um ciberespaço, e tal meio sendo como o que Levy e Lemos chamam de ciberdemocrático. Esse novo espaço traz uma transformação da mídia, onde a grande mídia abre espaço para um meio livre, interativo, em que qualquer membro de qualquer comunidade que esteja interessada produz informações em conjunto, uma inteligência coletiva.

“Por todo lo anterior, estoy indignado. Creo que puedo cambiarlo. Creo que puedo ayudar. Sé que unidos podemos. Sal con nosotros. Es tu derecho.”
E é assim que termina o manifesto do ¡Democracía Real Ya!, com o grupo ressaltando sua indignação, mostrando vontade de lutar por mudanças e convocando, na rede, toda a população, afirmando que juntos eles podem ser capazes de transformações no âmbito governamental.
O caso dos Indignados é o perfeito exemplo de um grupo até então heterogêneo que, por diversos motivos supracitados, achou no espaço cibernético o ambiente mais favorável para sua organização de luta. Um ambiente em que, pelo menos no caso da Espanha, todos podem se expressar livremente, e assim fazer de suas lutas algo com melhor e maior visibilidade, aumentando o grau de repercussão das lutas.

Referências Bibliográficas

http://www.guardian.co.uk/commentisfree/2013/apr/28/spain-indignados-protests-state-of-mind (acesso em 29/06/2013)

http://www.democraciarealya.es (acesso em 29/06/2013)

Webcast Library of Congress com Manuel Castells: “Networks of Outrage and Hope: Social Movements in the Internet Age”. http://www.loc.gov/today/cyberlc/feature_wdesc.php?rec=5619 (acesso em 29/06/2013)

CASTELLS, Manuel. A galáxia da Internet. Rio de Janeiro, Zahar, 2003.

HESSEL, Stéphane. Indignai-vos. São Paulo, Leya, 2011.

MORAES, Dênis de. “Comunicação alternativa, redes virtuais e ativismo: avanços e dilemas”. Revista de Economía Política de las Tecnologías de la Información y Comunicación. vol. IX, n. 2, mayo – ago. / 2007.

RUEDA ORTIZ, Rocio. Cibercultura: metáforas, prácticas sociales e colectivos en red. Nómadas (Col), num 28, abril, 2008, pp. 8-20. Universidad Central, Bogotá, Colombia.

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