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Yo Soy 132: Protestantes suprimidos pela mídia

MAGU TOZELLO

O Yo Soy 132, é um movimento iniciado em meados de 2012, sendo um de seu diversos motivos a atitude da mídia em relação as eleições presidenciais mexicanas. Tem como caráter social e político, gerando-se em volta da necessidade de uma verdadeira democracia e a paralisação do apoio midiático ao então candidato do PRI (Partido Revolucionário Institucional) Enrique Peña Nieto, cujo partido encontra-se no poder há mais de sete décadas. O movimento também busca o direito aos cidadãos de receberem informações não-manipuladas pela mídia e um processo eleitoral democrático.
Segundo os protestantes, o candidato recebia tratamento especial por parte de emissoras televisivas,  como Televisa e TV Azteca, e do jornal “Organização Editorial Mexicana”. Semanas após o início do movimento, o jornal inglês The Guardian confirmou as suspeitas sobre a relação da mídia com Peña Nieto através do vazamento de informação de dentro da Televisa por um de seus funcionários,  ficando-se claro o pagamento de grandes quantias do candidato para a emissora em troca de uma imagem positiva de si.
O estopim do movimento deveu-se a visita de Peña Nieto à Universidade Iberoamericana (frequentada pela elite mexicana) onde foi recebido por vaias e protestos dos alunos, que o questionaram sobre atos perpetrados em 2006, em San Salvador Atenco, enquanto era governador (enviou centenas de policiais as ruas, resultando em sérias violações aos DH). Os meios midiáticos resolveram ignorar os protestos, e alguns membros do PRI sugeriram que na verdade os protestantes estavam disfarçados de estudantes, mas que na verdade eram infiltrados do partido esquerdista.
Como reação, 131 alunos criaram um vídeo no Youtube onde mostram suas carteiras de estudante, afirmando manifestar livre e legitimamente, expressando também seu descontentamento com a mídia. O futuro apoio recebido para a sua caus ficou conhecido através do slogan “Yo Soy 132″. O símbolo # foi adicionado ao nome para demonstrar sua conexão com as redes sociais. Sua pagina no Facebook conta com mais de 220.000 curtir, seu Twitter com mais de 39 milhões de seguidores e o próprio movimento conta com mais de 30 células em acima de 10 países,  entre eles Brasil.
Através do progresso do movimento, a mídia foi limitando a informação ao público sobre futuros eventos políticos. No entanto, o próprio movimento utilizava fontes alternativas de notícias,  tais como Facebook, Twitter e até mesmo YouTube para ficar por dentro das eleições.
O “Yo Soy 132″ é democrático, independente, inclusivo e pacífico, organizado por estudantes e consistente de pessoas e grupos que trabalham a partir de diversas perspectivas mas um só objetivo: buscam um melhor futuro para o México. Tem como demanda fundamental o direito de acesso a informação e a liberdade de expressão. Suas ações incluem tradução de documentos e mídia visual para vários idiomas, além da promoção da comunicação e feedback em redes sociais.
Por ser um movimento social que não atua de forma tradicional, e sim sobretudo pela internet, pode ser encaixado dentro do modelo de “Comunicação Alternativa em Rede”, de Denis de Moraes. Esse autor afirma que essa forma de interação possui um viés anticapitalista,  que defende a liberdade de expressão e os direitos de cidadania. Segundo Moraes, “Para os movimentos sociais, é crucial a interdependência dialética com veículos que possam reverberar suas propostas, geralmente ignoradas ou menosprezadas pela chamada grande mídia [...]“. As redes buscam, assim, romper com os controles da mídia convencional, que no caso do Yo Soy 132, esconde pontos cruciais da população mexicana, e podem também “[...] ativar conexões,  simbólicas e solidárias,  de sujeitos e atores coletivos”, que no caso do movimento, é o que vem ocorrendo através de todo o mundo.
Apesar de todo o esforço do movimento “Yo Soy 132″, o candidato a presidência Enrique Peña Nieto acabou se elegendo em agosto de 2012 com 38% dos votos, contra 31% do candidato de esquerda Andrés López Obrador.

Vídeos:
https://www.youtube.com/watch?v=t6LgxA7FiM&feature=youtube_gdata_player
https://www.youtube.com/watch?v=igxPudJF6nU&feature=youtube_gdata_player

Referências:
https://mobile.twitter.com/YoSoy132Media
http://sosyosoy132.wordpress.com/about/
http://sosyosoy132.wordpress.com/posts/
http://sosyosoy132.wordpress.com/manifesto/
http://blogdaboitempo.com.br/category/colunas/denis-de-moraes/
http://observatoriodaimprensa.com.br/comunicação alternativa.pdf

Eleições de Obama e Marina Silva e a mudança de atitude em relação à rede.

DEBORA LEÃO

Em 2001, Castells escrevia que “seria surpreendente se a Internet, por meio de sua tecnologia, invertesse a desconfiança política profundamente arraigada” com a qual grande parte dos cidadãos encara o governo e a política em seus países. Para o autor, trata-se de uma crise à nível mundial da própria democracia, para a qual a Internet não poderia oferecer uma cura tecnológica.

Menos de uma década depois, em meados de 2008, o cientista político americano Michael Cornfield declarava que “sem Internet, não haveria Obama”. Como bem apontam os pesquisadores de “Politics 2.0”, o aforismo do professor da Universidade George Washington vem à tona não por se considerar uma verdade incontestável, e sim para ilustrar a impressão que o sucesso da campanha de Obama nos meios digitais causou logo de cara em estudiosos tanto da política quanto da cibercultura (1). A primeira campanha do atual presidente norte americano chamou atenção não por ser a primeira a utilizar as plataformas digitais e outros meios considerados alternativos na época, mas por ser a primeira a explorar esses canais de maneira integrada, vendo-os como prioritários e estratégicos.

À essa altura, já surgiram centenas de pesquisas sobre o caso Obama e uso de marketing online nas eleições dos Estados Unidos em 2008, e mais uma dezena de estudos sobre a evolução do uso das plataformas online na sua reeleição. Agora já não há novidade na campanha política online; ela é tão necessária quanto a campanha por meios de comunicação em massa tradicionais. Os marqueteiros já começam a buscar as lições que podem ser tiradas das eleições dos EUA em 2012, e a mesma lógica das “boas práticas” levou os maiores políticos brasileiros à rede em 2010. Com diferentes níveis de destreza, as campanhas online dos principais candidatos à presidência adotaram táticas como busca por doações online, incentivo à militância digital de seus apoiadores, uso marcante de redes sociais –em especial o Twitter –,  combate à boatos através da Internet.

my.barackobama.com

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Não é nenhuma surpresa, tendo em vista as diferenças estruturais entre os dois países (2) – tanto do ponto de vista do acesso à Internet quanto do ponto de vista dos processos, instituições e cultura políticas – que o impacto dos meios digitais tenha sido menor no caso brasileiro. As realidades profundamente distintas tornam a comparação dos resultados bastante difícil. E no entanto, as eleições de 2010 no Brasil não deixaram de ter seu quê de surpreendente.

No Brasil, ações que passaram por fora das campanhas oficiais muitas vezes conseguiram entender e utilizar melhor a internet do que o marketing eleitoral. Projetos como o Ficha Limpa e Voto Consciente trabalharam muito mais no espírito da ideia de democracia participativa do que as plataformas destinadas à interação criadas nos sites dos candidatos. Ao mesmo tempo, se destacou o perfil irreverente dos cidadãos e mais habilidosos usuários brasileiros conectados à rede, que produziram vídeos, perfis e hashtags com humor irônico e paródico, criando virais espontâneos.

Embora não tenha alcançado a presidência e nem ao menos o segundo lugar em número de votos, Marina Silva foi a candidata que de maneira mais exitosa se aproximou à esse modelo. Mesmo com pouco tempo de campanha nos meios tradicionais, a candidata conseguiu nada menos do que 20 milhões de votos com um partido considerado pequeno e novo.  O segundo turno aconteceu, em parte, por que houve a ascensão de uma “terceira candidata” em oposição aos projetos dos dois maiores partidos na disputa.

Os movimentos sociais contemporâneos, aponta Rueda Ortíz, resgatam o espaço público, o espaço do debate, da ocupação, da discussão. Ele se promove por meio de redes eletrônicas porém também por ações off-line, mais precisamente há uma continuidade entre as relações na rede e fora dela. As campanhas eleitorais que melhor souberam entender esse processo foram as que se destacaram no caso brasileiro e americano. Obama encorajou a participação política, o debate, buscou incentivar que os próprios eleitores se organizassem para espalhar sua mensagem online e off-line, ativando sua conexões e grupos de interesse. Foi criada uma plataforma de rede social (my.barackobama.com, que continua no ar e atualizado) para que os seus eleitores se organizassem, interagissem, mostrassem uns para os outros suas ações e eventos.

“O uso da Internet tende a aprofundar a crise da legitimidade política ao fornecer uma plataforma de lançamento mais ampla para a política do escândalo,” escreveu Castells em 2001. A tecnologia não é a questão central, e sim o “tipo de política que nossas sociedades estão gerando” esclareceu o autor. No entanto, o que se vê em iniciativas locais de governança das cidades, de portais de transparência e até mesmo de campanhas eleitorais não é somente a política transviada em entretenimento das massas. Vemos, em vez disso, cidadãos que podem ter e buscam se tornar cada vez mais informados e ao mesmo tempo, informantes. A mudança de atitude em relação ao uso da tecnologia, tanto por parte dos cidadãos quanto por parte dos governos e atores políticos, também tem o seu papel na mudança da política que é gerada pelas sociedades.

As tecnologias possibilitam maior transparência das informações governamentais, novas formas de compartilhamento e cooperação e maior interação entre sociedade civil e governo. Para chegar à ciberdemocracia, assim caracterizada, ainda há sem dúvida muito para caminhar. E no entanto, numa época em que o desinteresse político se considerava reinante, sem dúvida novas práticas – como a de eleições que cada vez mais contam com o engajamento dos cidadãos –  têm trazido essas características à tona. Segundo André Lemos, entre as máximas da cibercultura está a possibilidade de reconfiguração de práticas e espaços a partir do uso de recursos tecnológicos. Nada garante que essa reconfiguração de fato aconteça, e que seja estrutural e duradoura. E mesmo assim, podemos considerar que há bons sinais de que pouco a pouco a relação dos cidadãos com a política, com o espaço público se transforma.

(1)   Entendido a partir da definição de Rueda Ortíz, a cibercultura como um campo de estudo que busca compreender as transformações culturais que estão relacionadas e condicionadas pela introdução de tecnologias digitais nas sociedades contemporâneas.

(2) Para ler mais sobre essas diferenças, recomendo o ebook Mídias Sociais e Eleições 2010, disponível em http://issuu.com/papercliq/docs/ebook-midias-sociaise-eleicoes-2010

CASTELLS, Manuel (2003). A galáxia da Internet. Rio de Janeiro, Zahar.

GOMES, Wilson. Politics 2.0: A campanha de Barack Obama em 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rsocp/v17n34/a04v17n34.pdf (acessado em 21 de junho 2013)

RUEDA ORTIZ, Rocio. Cibercultura: metáforas, prácticas sociales e colectivos en red. Nómadas (Col), num 28, abril, 2008, pp. 8-20. Universidad Central, Bogotá, Colombia. Disponível em http://www.ucentral.edu.co/movil/index.php?option=com_content&view=article&id=557&Itemid=2456

LEMOS, André; LEVY, Pierre (2010). O futuro da internet. São Paulo, Paulus.

LOPES, Nayla Fernanda Andrade Lopes. Política na rede: Papel das redes sociais da internet na campanha eleitoral para a Presidência da República no Brasil em 2010. IV Congresso Latino Americano de Opinião Pública da WAPOR, Belo Horizonte. Disponível em: http://www.waporlatinoamerica.org/descargas/documentos/nayla_fernanda_andrade_lopes.pdf (acessado em 21 de junho de 2013)

AZEVEDO, Dilvan Passos de. Retórica e prática da democracia eletrônica: Comentários acerca do gap entre o discurso e a prática da ciberdemocracia. I Congresso Anual da Associação Brasileira de Pesquisadores de Comunicação e Política. Disponível em: http://www.compolitica.org/home/wp-content/uploads/2010/11/Azevedo_2006.pdf (acessado 21 de junho 2013)

Outras fontes: The Guardian Mashable